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Esperar sentado pela imunidade de rebanho?

Erico Vasconcelos [1] Diretor-Fundador da UniverSaúde

Vi há pouco uma reportagem na mídia escrita sobre uma cidade brasileira linda, reconhecida internacionalmente por suas belezas e praias paradisíacas, que observou recentemente um “boom” de casos confirmados de COVID-19. Cidade esta aliás que há dias encontrava-se numa condição aparentemente controlada quanto a epidemia, cujos esforços demonstravam terem alcançado algum sucesso.

Trata-se de mais uma evidência de um problema estrutural que persiste, que novamente se escancara e que está por trás de tudo que estamos diante com o COVID-19 no Brasil. Não adianta nada fechar o acesso ao município se o sujeito que lá reside vai pra um canto qualquer e trás o vírus! Simples assim. O problema de base que se revela aqui portanto é de ordem social, comportamental, educacional, atitudinal, ou seja, que tangencia o nosso frágil senso ético e moral. A conversa vai longe.

E pra dar conta do problema então, como faz? Na lógica de “não conseguir parir quem não tá grávido”, das duas uma: ou o Brasil se revisita, aprofunda a reflexão e desperta do sono profundo os seus líderes que ainda não perderam a capacidade de se indignar, que se apresentam, se esforçam, fazem a “política do bem” e trabalham para construir as “pontes para ligar as ilhas”, ou seguimos nesta curva ascendente e entristecedora de cada vez mais casos confirmados e óbitos pelo COVID-19.

Será mesmo a imunidade de rebanho a única alternativa que resta à sociedade brasileira para vencer a epidemia de Coronavírus?? Quantas pessoas que hoje estão entre nós, ou senão nós mesmos, precisarão morrer para que esta tal imunidade seja conquistada??

Uma reportagem sobre este tema foi publicada recentemente [2]. Ela mostrou que apenas 5,19% da população paulistana desenvolveu anticorpos ao COVID-19. Neste mesmo período na cidade de São Paulo, dados de 16/05/2020, 2.766 morreram e outros 3.143 ainda aguardam confirmação do óbito por Coronavírus [3]. No estado de SP já morreram 4.688 pessoas [4]. Da pra fazer uma regrinha de três básica aqui: se 5% já tem anticorpos contra o COVID-19 pra quase 3 mil mortes confirmadas na cidade de São Paulo pra chegar ao mínimo de 70% imunizados morrerão quantos mesmo?

Trata-se esta de uma epidemia que afeta a todos indistintamente e que expõe as nossas mazelas de forma extraordinariamente sofrível. Nossa desigualdade social histórica se revela de forma cada vez mais trágica. A atividade trabalhadora e econômica sofre pelo imperativo do confinamento e vem pressionando a sociedade e a classe política pela urgente retomada, trazendo à tona um debate que vai na contramão do que os estudiosos da ciência defendem. Tal cenário é de apreensão e medo.

Todos nós desejamos “virar a página” disto no curto prazo. Precisamos vencer a epidemia. Somos todos convidados a dar conta desta guerra contra este inimigo invisível e mortal. Nossa inteligência distinta e peculiar precisa saber lidar com este momento. Há outros elementos a considerar neste movimento, mas focarei naquele que considero estrutural para nós neste instante. Enquanto governos e sociedade de forma organizada não conseguirem sentar e “combinar pra não sair caro” qual será a nossa tática de enfrentamento, qual será o nosso plano para a vitória e o que vai ser de atribuição de um e de outro nós seguiremos assistindo aos noticiários informando recordes de óbitos em 24 horas e por aí vai.

A virada da curva da epidemia não vem do acaso, é produto de ações planejadas, articuladas pelos atores envolvidos e que quando bem coordenadas se mostram bem sucedidas no curto, médio prazos. Ela deve aliás considerar as tecnologias digitais que temos abundantemente a disposição inclusive. Sim, eu também acho isto difícil e delicado. Não há ingênuos aqui. Não temos lá tanto histórico republicano assim de ações que deram certo como produto deste diálogo. Sentimos falta de lideranças que sirvam de exemplo pra nossa Nação. Mas então o que nos resta?? Esperar sentado pela imunidade de rebanho??

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[1] Erico Vasconcelos é cirurgião-dentista, estomatologista, especialista em Terapia Comunitária, em liderança e desenvolvimento gerencial de organizações de saúde e com MBA em gestão de pessoas. É apaixonado pelos desafios da gestão dos serviços de saúde. Há 15 anos atua na gestão da Atenção Básica, do SUS, na Segurança e Qualidade e na Gestão Estratégica de Pessoas. Foi gestor de saúde de diversas organizações privadas e municípios. Recentemente atuou no governo federal elaborando políticas e desenvolvendo ações de apoio e educação. Desde 2005 atua na formação em serviço de gestores e profissionais de saúde pelo Brasil afora. Trabalhou como Tutor e Coordenador de Cursos na EaD da ENSP, UnASUS-UNIFESP e na UFF. Foi Professor de Saúde Coletiva da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) e em outros cursos de várias Universidades. Fundou a UniverSaúde em 2017, uma startup para a Saúde que ajuda gestores do SUS a fazerem mais e da melhor maneira possível com menos dinheiro, associando informação e inteligência por meio de tecnologias digitais. Já trabalhou em mais 30 organizações e hoje atua em diversos projetos potentes com organizações públicas e privadas.

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