A volta de quem nunca deveria ter saído
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A volta de quem nunca deveria ter saído

Erico Vasconcelos [A]

Rita Santana [B]

A Portaria no. 635 de 22/05/2023 instituiu, definiu e criou o incentivo financeiro federal destinado à implantação, custeio e desempenho para as modalidades de equipes multiprofissionais na Atenção Primária à Saúde. Ela enfim traz de volta ao cenário da saúde pública brasileira as ações das equipes do Núcleo de Apoio à Estratégia Saúde da Família (NASF) lançada pela Portaria no. 154 de 24/01/2008 - uma vez que haviam sido removidas pelo governo passado.


Em uma simples busca na base federal do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES), competência junho/2023, encontramos o cadastro de 5.138 equipes do tipo Equipe do Núcleo Ampliado de Saúde da Família da Atenção Básica (NASF AB). Esse traz uma informação importante: alguma parte significante dos gestores do Sistema Único de Saúde (SUS) dos municípios brasileiros manteve o custeio destas equipes e/ou profissionais mesmo sem o cofinanciamento federal. Isso denota a importância deste conjunto de profissionais de saúde de nível superior, para além do médico, enfermeiro e dentista das equipes até então consideradas "mínimas", no exercício da integralidade do cuidado nesse âmbito da atenção. Um espaço conquistado com muito trabalho e fundamentado em bons resultados certamente.


Nós tivemos a chance de participar das ações do NASF desde o começo das primeiras equipes. O olhar e o envolvimento dos profissionais como o fisioterapeuta, o psicólogo, o fonoaudiólogo, o médico ginecologista, dentre outros tantos, traziam uma potência sem tamanho para o trabalho das Equipes da Estratégia Saúde da Família, por exemplo. Ações multiprofissionais desenvolvidas no âmbito coletivo, além das ações individuais executadas por eles propriamente ditas, agregavam valor à produção do cuidado com as pessoas dos nossos territórios, respondiam as necessidades delas trazendo muitas vezes conforto e alívio. Porque na prática a gente dava o que as pessoas queriam simplesmente. Atenção, resposta e um plano de cuidado para desenvolver com elas - responsabilizando-as inclusive neste processo.


Isso tudo assume hoje um caráter de importância extraordinariamente maior após a pandemia de COVID-19. Primeiro, o desafio de retomar as ações da Atenção Primária à Saúde no SUS dos municípios da forma como a gente sempre pensou baseada nos quatro pilares mínimos: acessível, cuidadora, integral e resolutiva. Pensada em rede, articulada e integrada com a atenção ambulatorial especializada. Segundo, as demandas do pós-COVID e suas repercussões seguem "batendo à porta" dos serviços, trazendo questões complexas para serem tratadas e resolvidas da forma esperada sem a presença destes profissionais de saúde que até então faziam parte do NASF. Tal fragmentação na produção do cuidado às pessoas no âmbito da atenção primária à saúde do SUS caracteriza uma atenção marcada pela fragilidade da Rede de Atenção à Saúde e pela perda de oportunidades - o que fortalece a mentalidade da pouca resolutividade das ações produzidas pelos trabalhadores da saúde em seus serviços. Sem falar das consequências em relação a geração de encaminhamentos desnecessários à atenção especializada, a busca pela assistência em serviços de urgência médica e à menor eficiência dos serviços.


Louvamos a iniciativa desta retomada das equipes agora denominadas eMulti com a expectativa de que consigam apoiar o fortalecimento da atenção primária à saúde no SUS neste momento tão complexo, ampliando suas ações neste nível bem como sua capacidade de respostas à população.


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[A] Erico Vasconcelos é cirurgião-dentista, estomatologista, especialista em Terapia Comunitária, em liderança e desenvolvimento gerencial de organizações de saúde e com MBA em gestão de pessoas. Há 17 anos atua na gestão da Atenção Básica, do SUS, na Segurança e Qualidade e na Gestão Estratégica de Pessoas de organizações de saúde. Foi gestor de diversas organizações privadas e municípios. Atuou no Ministério da Saúde entre 2013 e 2016 no Departamento de Atenção Básica elaborando políticas e desenvolvendo ações de apoio e educação. Desde 2005 atua na formação em serviço de gestores e profissionais de saúde pelo Brasil afora. Trabalhou como Tutor e Coordenador de Cursos na EaD da ENSP, UnASUS-UNIFESP e na UFF. Foi Professor de Saúde Coletiva da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) e em outros cursos de várias Universidades. Fundou a UniverSaúde em 2016, uma A UniverSaúde é um empresa que prepara gestores e profissionais de saúde para evitarem desperdícios e melhorarem a eficiência das organizações. Já trabalhou em mais de 50 municípios e organizações. Atualmente desenvolve projetos com o Hospital Albert Einstein, o HCor, dentre outros diversos municípios pelo Brasil afora.


[B] Rita Santana é Enfermeira, especialista em Atenção Primária à Saúde e em gestão da informação em Saúde. Faz história na UniverSaúde produzindo ações de apoio e educação no Programa Previne Brasil juntamente com gestores e profissionais das Equipes de Saúde da Família e APS de todo o Brasil. Atualmente gerencia os projetos de análise de dados da UniverSaúde.


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